
Paoulla Maués, diretora da Polícia Civil, afirma que a subnotificação é “enorme”, principalmente em cidades
A cada 19 horas, uma criança ou adolescente foi
estuprada no Rio Grande do Norte na primeira metade de 2022. Dados da
Coordenadoria de Informações Estatísticas e Análise Criminal da
Secretaria de Estado de Segurança Pública e da Defesa Social
(Coine/Sesed) mostram que no primeiro semestre deste ano 118 crianças (0
a 11 anos) e 111 adolescentes (12 a 17 anos) foram violadas sexualmente
em todo o Estado, o que representa um aumento de 4,5% em comparação com
o mesmo período do ano passado.
A soma dos crimes nestes dois grupos etários corresponde a 73,3% de
todos os estupros registrados no RN de janeiro a junho,
independentemente da idade. Foram 312 crimes desse tipo contabilizando
todas as idades. O número é 4,3% maior do que o contabilizado no
primeiro semestre de 2021: 299. Neste ano, março foi o período com o
maior registro de estupros entre todas as idades: 75 casos foram
denunciados à polícia.
Para além dos números, o
cenário é ainda mais grave, de acordo com Paoulla Maués, diretora de
Planejamento da Polícia Civil. Isso porque a subnotificação é
considerada muito alta, principalmente nas cidades mais afastadas dos
grandes centros do Rio Grande do Norte.
“A
subnotificação é enorme. Os hospitais, as unidades de saúde básica devem
notificar a Polícia sempre que houver indícios de violação de direito
da criança. A escola também tem que ter esse dever de notificar para a
gente iniciar uma investigação. Normalmente a violência sexual é
praticada várias vezes e a criança apresenta mudanças no comportamento,
então é óbvio que a escola, por exemplo, que vê todo dia aquela criança,
vai perceber algo estranho”, afirma Maués.
Se
atentar a pequenos sinais é determinante para identificar uma possível
violência, diz a delegada Paoulla Maués. “Às vezes uma criança que é
extremamente calma, começa a ficar agressiva, de repente ela começa a
ter comportamento destoante do que ela tinha antes. Às vezes a criança
dá esses sinais, mas é desacreditada, não é dada importância daquilo que
ela está passando, que ela está dizendo porque a criança é
desconsiderada”, acrescenta.
Segundo Sandra Pequeno, é impossível saber se o houve crescimento real dos casos ou apenas das notificações
O índice de estupros não se
configura nos processos judiciais. Em 2022, nas duas instâncias, somente
56 casos foram a julgamento. À TRIBUNA DO NORTE, o Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Norte (TJRN) informou que a diferença entre as
denúncias e os julgamentos são justificados pelos princípios
constitucionais do próprio processo, que respeita os ritos da ampla
defesa e do contraditório.
“Além disso, cada
processo tem seu curso e peculiaridades próprias, que podem acelerar ou
atrasar seu julgamento. Todas as comarcas do Estado possuem competência
para o julgamento deste tipo de crime – o qual deve ser julgado pela
comarca com competência territorial pelo local onde ocorreu o fato – não
havendo uma realidade uniforme entre as diversas unidades judiciárias
competentes no RN, nem exclusividade para o julgamento deste crime. As
unidades lidam com uma diversidade de matérias, principalmente as varas
não especializadas”, declarou o TJRN em nota.
O
número de registros de violência sexual tem ritmo crescente no Estado.
De 2020 para 2021 houve crescimento de 5%. Em números absolutos, os
estupros subiram de 578 para 607. A coordenadora de Promoção e Defesa
dos Direitos Humanos do Estado, Sandra Pequeno, diz que não é possível
afirmar com precisão se os números refletem, de fato, um crescimento nos
casos ou retratam aumento da conscientização, que consequentemente
eleva a notificação.
“Às vezes acontecia a
infração e as pessoas se calavam. Com os órgãos, como a ouvidoria de
direitos humanos, canais de denúncia e outras tratativas que estão sendo
implementadas, as pessoas estão denunciando mais. Então, acredito que
quando as pessoas se educam mais, os aumentos dos registros acontecem”,
diz a profissional.
Em todos os cenários, de
2020 para cá, quanto mais baixa a faixa etária, maior é o registro de
estupros, conforme mostram as planilhas da Coine. O quadro alarmante
ajuda a entender a subnotificação no Estado, diz a psicóloga Melina
Rebouças. Segundo ela, em virtude da falta de discernimento,
característico da pouca idade, as crianças sequer sabem que estão sendo
violadas e, por esse motivo, casos assim acabam sendo silenciados.
“Daí
a importância de se falar em educação sexual nas escolas porque é uma
forma de proteger, dessa criança ficar atenta ao que está acontecendo. A
informação pode ajudar e tem ajudado, tem muitas situações que nós já
vimos de crianças pedindo socorro a um professor porque durante a aula
se deu conta de que estava sofrendo uma violência sexual”, detalha
Melina.
Abusos sexuais
Veja abaixo os números do RN e como fazer denúncias
Canais de denúncia
nDPCA: R. Ângelo Varela, 1465 – Tirol (3232-6184);
nDeam Zona Sul: R. Nossa Senhora de Candelária, 3401 – Candelária (3232-2530);
nDeam Zona Norte: Fórum Varella Barca, Av. Guadalupe, 2145 – Potengi (98135-6792);
nPlantão Deam: Av. João Medeiros Filho, 2141 – Potengi (3232-1547, 3232-6291 e 98135-6538);
nDeam Parnamirim: R. Sub. Oficial Farias, 1487 (98123-4114);
nDeam Caicó: R. Maria das Neves Dantas, 35 (3421-6040);
nDeam Mossoró: R. Julita G. Sena, 241 (93135-6111).
nOuvidoria Geral de Direitos Humanos: 98147-3498 ou ouvidoria.semjidh@gmail.com;
nCasa de Acolhimento: 99663-0124 ou 98623-3681.
Números
Estupros por faixa etária no primeiro semestre de 2022
0 a 11 anos: 118 casos;
12 a 17 anos: 111 casos;
18 a 24 anos: 25 casos;
25 a 29 anos: 18 casos;
30 a 34 anos: 9 casos;
35 a 64 anos: 26 casos:
65 ou mais: 1 caso;
Sem informação: 4 casos;
Total: 312 estupros.
Estupros por faixa etária no primeiro semestre de 2021
0 a 11 anos: 108 casos;
12 a 17 anos: 111 casos;
18 a 24 anos: 21 casos;
25 a 29 anos: 9 casos;
30 a 34 anos: 17 casos;
35 a 64 anos: 23 casos:
65 ou mais: 2 casos;
Sem informação: 8 casos;
Total: 299 estupros.
Tribuna do Norte
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