Após classificar ação de mercenários como rebelião e “punhalada nas costas”, Vladimir Putin consegue evitar conflito em território russo
Desde 2000, quando assumiu o poder na Rússia, Vladimir Putin não enfrentou crise interna semelhante à vivida nas últimas 48h. A tensão com o grupo mercenário Wagner, aparentemente superada, ainda tem impacto incerto na guerra da Ucrânia, mas colocou uma possível rebelião militar no teatro geopolítico internacional e prejudicou a imagem do presidente russo.
Putin falou uma única vez sobre a rebelião e, em um primeiro momento, classificou o motim como uma “punhalada nas costas”. O líder dos paramilitares, porém, continuou se declarando leal ao presidente russo. Yevgeny Prigozhin diz apontar suas armas somente contra o Ministério da Defesa, chefiado por Serguei Choigum, e o comandante das Forças Armadas do país, o general Valeri Gerassimov.
Após o recuo do grupo Wagner no fim do dia, o presidente russo mudou a estratégia, e o Kremlin optou por não punir Prigozhin. A decisão foi interpretada como sinal de fragilidade, mas também como uma tentativa de manter sua imagem imaculada.
Quem negociou o acordo para fim da rebelião foi Alexandr Lukashenko, presidente da Bielorrússia. O aliado do presidente russo garantiu ao grupo Wagner segurança em suas fronteiras e, dessa forma, Prigozhin aceitou recuar para o país vizinho, também usado para lançar ataques contra a Ucrânia.
Por outro lado, a linha de defesa supostamente montada para conter uma possível ofensiva contra Moscou foi comandada pelo líder da Chechênia, Ramzan Kadyrov. Ele classificou a ação do grupo Wagner como uma “traição vil”. As forças especiais chechenas teriam sido vistas próximas a Rostov, de acordo com mensagem divulgada no Telegram por um oficial russo no território ocupado da Ucrânia, Vladimir Rogov.
De acordo com o Kremlin, os membros do grupo Wagner que não aderiram à “rebelião” liderada por Prigozhin serão incorporados ao Ministério da Defesa. A guerra da Ucrânia começou em 24 de fevereiro de 2022. Inicialmente, ela foi vista como uma “caminhada no parque” para o outrora visto como todo poderoso exército russo. O apoio ocidental ao presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, com envio de armamento e veículos, dificultou a ofensiva russa.
Geopolítica
Internacionalmente, Putin também precisará de estratégia para se recolocar. Após a crise, o presidente ucraniano classificou “a fraqueza da Rússia” como “óbvia”. Zelensky ainda afirmou que a “Ucrânia é capaz de proteger a Europa da expansão da maldade e do caos russo”. O discurso fortalece o plano do país invadido para lançar uma contraofensiva e recuperar os territórios tomados.
A crise também reforçou o apoio ocidental à Ucrânia. Presidente dos EUA, Joe Biden reafirmou no sábado seu “apoio inabalável” ao país durante uma ligação com líderes da França, Alemanha e Reino Unido. O país norte-americano também decidiu adiar sanções já anunciadas contra o grupo Wagner.
Por outro lado, Putin demonstrou contar com apoio imediato da Chechênia e da Bielorrússia. Além disso, o presidente russo recebeu sinalizações de apoio do Irã. O representante do Ministério de Relações Exteriores, Nasser Kanaani, disse à mídia estatal que os muçulmanos “apoiam a lei e a ordem na Federação Russa”. Enquanto isso, há uma disputa envolvendo a Turquia.
De acordo com o Kremlin, em ligação realizada neste sábado, o presidente Recep Tayyip Erdogan ofereceu “total apoio” a Vladimir Putin. O escritório do turco, porém, conteve-se em afirmar que o líder do país pediu uma resolução “pacífica e calma” para a crise envolvendo o grupo Wagner. Também chamou a atenção o silêncio de Xi Jinping, presidente da China e aliado de Putin, sobre o conflito.
História
Esta não é a primeira vez que uma guerra insustentável muda o rumo da política russa. Na Primeira Guerra Mundial, as sequenciais derrotas do exército russo enfraqueceram o Czar Nicolau II. Após a revolução de fevereiro de 1917, o parlamento de maioria burguesa decidiu permanecer no conflito para honrar acordos internacionais, favorecendo Lênin e demais políticos comunistas, defensores de um acordo de rendição.
Em junho, após novas derrotas na Primeira Guerra, militares abandonaram seus postos de batalha, e o governo recém-empossado após a queda do Czar não conseguiu conter as revoltas. Dessa forma, em outubro, Lenin e seu grupo revolucionário encontrou espaço para o levante que colocou os comunistas no poder.
Metrópoles
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